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24/03/2010

Jazz pela Madeira

JAZZ PELA MADEIRA é um evento de solidariedade para com as vítimas desalojadas da Madeira, a realizar no Centro Cultural Malaposta, domingo, dia 28 de Março de 2010, pelas 21h30.

Este evento caracteriza-se por um espectáculo de Jazz e um leilão de obras de arte, cujos fundos angariados serão transformados em bens (sentidos como necessários no terreno) e enviados para as pessoas que ficaram desalojadas, através da Caritas do Funchal.


 
Concerto: Maria Viana (voz), Kirk Ligtsey (piano), Rão Kyao (sopros), Carlos Barreto (contra-baixo)
Obras de: Tomáz Vieira, Eduardo Nery, Sara Maia, Sofia Areal, Luís França Machado, Manuel Botelho, Jorge Pinheiro, Vanda Vilela, José Cândido, Maria Amaral, Cruzeiro Seixas, Raul Perez, Silva Palmeira e Francisco Aquino.


Este evento não está a ser divulgado através dos meios institucionais, pelo que se agradece a todos a colaboração na sua divulgação.

17/03/2010

Coisas que não somos

Alguns meses antes de a minha mãe morrer (ainda nem estava diagnosticado o cancro), participei numa formação sobre estas questões e percebi de uma vez por todas como é importante falar da morte sem rodeios, sem considerar que é mórbido ou um assunto tabu. Sinceramente, perdi a tolerância para estas atitudes de "faz de conta".

Já aqui falei sobre isto. A minha mãe era uma pessoa muito activa e imaginativa, e em tudo quanto era folha de papel, blocos, agendas, caderninhos, escrevia projectos, histórias, pensamentos, experiências de vida... E coleccionava coisas de viagens, guardanapos, pratinhos, souvenirs. Guardava tudo. Esse apego é contagioso, porque quando alguém morre, quem fica apega-se a essas mesmas coisas, porque personifica nelas o ente querido, e é um grande sofrimento libertar-se delas. Por isso, entre outras coisas, pedi-lhe que organizasse a sua papelada, que deitasse fora o que era supérfluo, porque iria custar-nos muito decidir o que fazer-lhes, quando ela morresse.
Valeu-me o facto de ela ser uma pessoa sensível a estas questões, só não me valeu o curto tempo que teve para cumpri-las. Mas mesmo assim, alguma coisa foi feita e o simples facto de termos falado sobre o assunto deu-me maior liberdade de acção.

Olho à minha volta e vejo que estou perante um ambiente análogo. Papéis, recortes, canetas, revistas, chaves, fios, caixas cheias de tudo e de não sei quês... Ele identifica-se com as suas coisas como partes integrantes da sua identidade, o que, a meu ver, o leva à crença de que não pode viver sem elas, de que se sentirá desvinculado de si mesmo na sua ausência.
Como poderei então eu, algum dia, desapegar-me da sua identidade, do que ele é?
Quanto a mim, quando eu morrer pode ir tudo para o lixo, mesmo as coisas de que mais gosto. As coisas só valem pela utilidade que têm enquanto eu viver aqui, depois deixam de me ser úteis e não me revejo, nem me quero perpetuar nelas. O que fui, sou, está no que fiz, não no que tenho e nem sequer nas minhas palavras.

15/03/2010

Vida e morte, o par eterno

Pergunto-me inúmeras vezes se quando falamos de vida e morte sentimos mesmo de que se trata apenas de um ciclo. Aceitamos quase poeticamente os ciclos de finitude e renascimento sucessivos da natureza - os Outonos e Primaveras que nos encantam - mas temos imensa dificuldade em aceitar essa finitude para nós próprios.

Aprendemos, ao longo da História, que todas as civilizações tiveram tradições espirituais e religiosas que acreditavam na vida para além da morte. Mas apesar de algumas dessas tradições ainda subsistirem, na sociedade moderna a crença profunda perdeu-se do colectivo cultural e não sustenta o nosso caminhar. Nós não somos efectivamente criados e orientados nesse acreditar, já não nos está na massa do sangue.
Quanto maior for o apego às coisas materiais, menor é a disponibilidade para as questões do espírito. De alguma forma isto explica-me porque se afastaram as sociedades de consumo das crenças filosofico-religiosas. Os deuses de agora são outros.
Talvez por isso nos amedrontemos tanto face à morte e, particularmente no ocidente, seja tão constrangedor pensar,  falar, ou mesmo encarar a sua presença.  Falta-nos o sentido. Por isso fazemos como a avestruz, enterramos a cabeça na areia e recusamos vê-la. É como se ela não fizesse parte da vida.
No entanto, o que dá sentido à nossa vida é, em última análise, o que dá sentido à nossa morte. Cumprimo-nos e fechamos o ciclo. Estarmos bem connosco e com os outros é tão essencial para a harmonia da nossa vida, como é vital para a serenidade necessária nos últimos momentos. Necessária para quem parte, para que parta com a consciência de missão cumprida; e para quem fica, para que viva com a consciência de que fez o que estava ao seu alcance e faça o seu luto em paz.

Se interiorizarmos que a morte pode chegar a qualquer momento os nossos dias serão mais ricos, porque essa consciencialização faz a diferença e leva-nos a conferir maior intensidade à nossa vivência, a buscar a nossa plenitude, a procurar curar e nutrir os nossos vínculos afectivos, a dar prioridade ao que dá sentido à nossa existência. Inclusivamente, confere-nos maior sentido prático em assuntos que poderão ser problemáticos para quem nos sobrevive.
E isto só é possível pelo afecto, pelo diálogo, pelo desfazer de tabus e preconceitos, e pelo confronto com o medo.

"Viver Não Dói" (Excerto)
Carlos Drummond de Andrade

Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas
e não se cumpriram.
(…)
A cada dia que vivo,
mais me convenço de que o
desperdício da vida
está no amor que não damos,
nas forças que não usamos,
na prudência egoísta que nada arrisca,
e que, esquivando-nos do sofrimento,
perdemos também a felicidade.

A dor é inevitável,
O sofrimento é opcional.

Tal qual como cá!



Vida dura? É a dos deputados portugueses, pobrezinhos...