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20/06/2010

O quinto vôo da borboleta

A delicadeza de um símbolo em papel, que ele me ofereceu.
Neste dia em que uma borboleta é mais do que um fim de ciclo, ou um bater de asas.
É o quinto ano de um vôo para o eterno, de uma saudade que se faz sempre nova, de memórias que assomam como visões etéreas, quase irreais.
Perceber que já tudo foi, que naquele dia a vida mudou, definitivamente.
Muito, tanto, se perdeu... Nada jamais será a mesma festa, os mesmos risos, os mesmos afectos, a casa cheia, de gente, de lágrimas, de música, de gritos, de vida!
Dessa vida que ela tanto amou, apaixonadamente.

19/06/2010

Histórias de viagem

Tenho uma mnemónica indissociável da atribuição do Nobel a José Saramago. Éramos um pequeno grupo de oito pessoas, em Outubro de 1998, em viagem pelo Peru. E naquela noite, na cidade de Cuzco, andávamos cansados à procura de um restaurante ainda aberto, que fosse minimamente apelativo para um jantar tardio. E ali aterrámos. E assim que o gerente percebeu que éramos portugueses, deu-nos os parabéns e foi buscar o jornal para nos mostrar a notícia. E assim soubémos, olhando a fotografia do escritor sobre a parangona da conquista do prémio Nobel da literatura, que Saramago tinha sido galardoado.

Um ano depois, em Outubro de 1999, éramos um grupo de dezasseis numa viagem nocturna de comboio, de quase dezassete horas, de Hannoi a Hué, no Vietname. Um comboio a cair de maduro, um serviço de bar miserável, um calor húmido que nos prostrava. Estava feita a promessa de uma longa e difícil noite. Alguém disse vamos beber para esquecer. Pingaram umas cervejas daqui e dali, ao que o guia Chris juntou uma garrafa do potente vinho-de-cobra. Foi um clique para a boa disposição, as anedotas, a paródia. Cantou-se muito e bebeu-se demais, o suficiente para soltar a fadista que há em mim e esgoelar-me nuns fados da Amália Rodrigues.
No dia seguinte, num telefonema para a família, soube que o meu sobrinho tinha nascido e a Amália tinha morrido.

E ontem, quando um dos meus companheiros de viagem me disse estou a ligar-te por causa do Saramago, lembro-me sempre da viagem ao Peru quando se fala dele, percebi que as memórias de viagem não são privadas, são também o memorial de uma história colectiva.

18/06/2010

O imperativo masculino

Seja como for amor existe e vale a pena (...) Depois é... ter juízo quando realmente acontece, a dois, com pés e cabeça. E é nisso que mais falhamos. No juízo. Até porque hoje em dia estamos formatados para pensar apenas o "melhor para mim", o que qualquer criatura inteligente sabe ser dicotómico face ao amor. Quem quer o melhor para si dificilmente amará "à campeão". Quem ama de forma saudável sabe que a coisa não tem nada a ver com o sucesso do princípio individualista do "melhor para mim". Capitão Microondas

Retirei estas palavras de uma caixa de comentários onde foram deixadas. Achei interessantes por virem de um homem, porque demonstram inteligência na objectivação do maior problema de uma relação que é o Eu versus o Nós, coisa que é rara na versão masculina.

Porque são maternalmente educados na óptica do receber e não do dar, os homens são os primeiros a porem as suas necessidades acima das necessidades da relação. Primeiro do que tudo estão eles, os seus desejos, o seu trabalho, as suas distracções, os seus timings, os seus compromissos com os outros. Depois vem a relação, que é assim um lugar sem prioridade e sem compromisso, onde se vai quando não se tem mais nada para fazer e que se espera seja uma espécie de oásis com uma espécie de gueixa que não levante muitas questões, nem dê muito trabalho. É um lugar para relaxar, que tem que estar sempre 100% disponível para acolhê-los. Não é um lugar de atenção ao outro, é apenas one-way receiving. É um lugar de onde eles querem tirar sem ter que pôr, é o ventre materno de que eles se alimentam até secar. É um lugar em que eles conjugam o "eu" como um verbo no imperativo. É um lugar onde qualquer mulher inevitavelmente se cansa de estar, quando percebe que já não lhe falta nenhum cromo na colecção de "nãos". E é um lugar onde infelizmente não existe livro de reclamações.

06/06/2010

Estados de alma

























Triste, pela morte do escritor João Aguiar, aos 66 anos.
Enriquecida, pelos ecos da nossa história que me chegaram pela sua mão.
“A Voz dos Deuses”, A Hora de Sertório”, “O Trono do Altíssimo”.
Preciosos momentos de leitura na minha vida e um enorme contributo ao romance histórico português.
Sem palavras, o meu agradecimento, admiração e louvor.